"Prezados colegas, amigos e alunos,
estou estarrecido. Nunca pensei que ia viver isso na na nossa
universidade. Uma indignação enorme me fez deixar a assembléia de
professores no prédio da História e descer correndo para a reitoria. A
informação que tinha chegado à nós era de que o batalhão de choque
estava soltando bombas sobre os estudantes e funcionários na reitoria.
De alguma maneira, como professor, imaginei ter - junto com outros
colegas - a força necessária para arrefecer o conflito. Era preciso
evitar o pior, evitar que algum estudante se machucasse. Tínhamos
visto nos jornais no dia anterior, policiais com metralhadoras.
Chegando mais perto, uma fumaça enorme, estudantes correndo, e um
clima bastante ameaçador. Um aluno passou por nós dizendo que não
devíamos ficar ali. Retruquei: Não. Vamos ficar aqui.
Descemos mais um pouco e uma tropa de choque, cacetetes, bombas, spray
de pimenta, marchou em nossa direção.
Subimos a calçada, que passem ! Tratava de saber o que de fato
ocorria, procurar responsáveis, tentar negociar, verificar se alguém
estava ferido. Mais perto, um policial do batalhão - uns quinze -
mandou a gente se afastar. Dissemos que éramos professores. Se
afastem! gritaram. Somos professores! Eles jogaram spray de pimenta na
nossa direção. O Thomás que estava um pouco mais a frente, de
carteirinha na mão, recebeu o spray nos olhos. Saímos correndo. Uma
bomba de gás caiu a um metro dos meus pés. Parei um pouco e olhei na
direção dos policiais com toda a raiva que já pude sentir.
Um policial com uma bomba na mão olhou pra mim. Senti que iríamos
receber mais um presente da corporação. Estupei o peito e falei
gritando: Você vai jogar na gente? Somos professores! Você vai jogar?
O absurdo era tanto que fui mais absurdo ainda. Como eu podia fazer um
negócio desses? Mas fiz.
Não dava mais para ficar lá. Chamei a Vivian Urquidi e o Jorge Machado
para subir novamente até à História. O Thomás já tinha saído porque
mal conseguia abrir os olhos. Meus olhos também ardiam muito.
Eu só gostaria de saber: o que um professor de carteirinha na mão, um
outro com mochila nas costas, pasta em uma mão e blusa na outra, outra
professora com uma flor na mão representam de perigo ao patrimônio da
USP? Gostaria de saber até onde a tese de preservação do patrimônio se
sustenta? Que espécie de comunicação e negociação é essa, que coloca
policiais cegos a serviço da Reitoria? Para onde fomos? Para onde foi
a experiência de 75 anos em produzir saber?
Saudações acadêmicas.
Rogério Monteiro de Siqueira
Professor Doutor EACH-USP
História e Geometria
http://www.each.usp.br/rogerms
Escola de Artes, Ciências e Humanidades - Universidade de São Paulo
Arlindo Bettio, 1000, Ermelino Matarazzo, 03828-000, São Paulo."
http://letrasemgreve.blogspot.com
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